sábado, 5 de junho de 2010

A Canção dos Nibelungos - Parte Final

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Veja aqui a Parte 1 desta análise - A Linguística e a Epopeia

Veja aqui a Parte 2 desta análise - A presença do maravilhoso na construção dos personagens

Veja aqui a Parte 3 desta análise - O Herói


Veja aqui a Parte 4 desta análise - O papel dos personagens femininos


Relação dos personagens com a morte

O cenário é conturbado: a Europa do século VIII ao X, com seus reinos recém-formados, após a queda do Império Romano no século V. invasões, guerras, disputas de (e pelo) poder... tudo isso faz parte do dia-a-dia do herói épico medieval (assim como de todo o povo medieval).

Tal realidade era, certamente, visível aos olhos do(s) autor(es) do poema, quando da sua elaboração, e esses elementos não poderiam deixar de constar nos escritos, uma vez que a literatura nada mais é do que a representação artística da história, vista por aqueles que têm o poder de abstrair os fatos “reais” e transformá-los em “sua história”, com nuances e características próprias. É como uma fotomontagem dos dias atuais: o real está lá, escondido, e cabe àquele que vê a mudança discernir o que existe do mundo “palpável” daquilo que é abstrato, metafórico, ilusório e irreal.

O cavaleiro épico não tinha medo da morte. A glória em morrer como um bravo guerreiro superava qualquer temor de perecer, uma vez que seus atos, sua coragem e sua bravura o conduziam para um destino glorioso - vencendo ou não - pois em ambos os casos ele seria visto como um realizador de benfeitorias, tendo, assim, cumprido seu papel de cavaleiro.

Embora iminente e previsível, a morte de um bravo cavaleiro era lamentada na proporção de sua bravura e feitos. Vemos isto quando da morte de Siegfried e, ao final, da de Rüdiger. Neste último caso, há um grande lamento por partes daqueles que causaram sua morte, principalmente pela forma como ela ocorreu.

É provável que os garotos da época medieval sonhassem em se tornar cavaleiros. Toda a força, “pompa” e grandeza que a imagem representava certamente deveria atrair o fascínio de jovens em todos os cantos da Europa. É o cavaleiro que faz o papel do próprio rei numa batalha; lá, ele o representa, assim como representa seu povo e seu país. É por sua luta que seus senhores expandirão ou diminuirão seu poder, seus territórios. O futuro dos próprios reis e de toda a nobreza dependia da ação cavaleiresca.

A Epopéia - retrato do mundo medieval

A força sobre-humana de certos personagens pode ser vista, ao mesmo tempo, como uma forma de exaltação e auto-afirmação do povo descrito na epopéia., assim como pode representar a dificuldade que um sentimento ligado a estes personagens representa. Por exemplo, Brunhild tem sua força espetacular até o dia de sua primeira noite de amor com Gunther; em seguida, ela parece perder seus poderes. Lembremos, pois, que quando rainha da Islândia, ninguém era capaz de desposá-la e, como conseqüência, perdia a vida. Essa imagem pode ser tomada como uma metáfora da dificuldade da conquista, da realização amorosa e da dificuldade de chegar ao ápice do amor pleno e total.

Em certos aspectos, Brunhild representa a condição da mulher da idade média, pois o fato de ela se entregar apenas àquele que demonstrasse força física superior à sua, leva-nos a crer que ela buscava, na realidade, alguém capaz de dominá-la, como se apenas esse guerreiro e rei fosse capaz de lhe proporcionar proteção e segurança.

Assim, como um país poderoso invade e domina um país mais fraco, da mesma forma um guerreiro mais poderoso a dominaria, mas também seria capaz de lhe fornecer as condições necessárias para seu bem-estar e sobrevivência.

Segundo Campbell, o poeta trovador era o verdadeiro romântico. Ele colocava a mulher num patamar acima, numa posição como a de adoração, sendo seu amor, por muitas vezes, platônico e inalcançável. Isto acontece tanto com Siegfried em relação a Kriemhild, assim como com Gunther em relação a Brunhild. Em segundo plano, quando dos torneios de justas que aconteciam sempre que havia importantes visitantes de um reino em outro, temos as jovens donzelas que almejavam se casar com os guerreiros que mais se destacassem na partida, sendo a recíproca verdadeira: estes davam tudo de si para uma performance satisfatória aos olhos de suas futuras amadas.

A força física servia como uma vitrine de virtudes de um tempo de guerras e conquistas territoriais. Quanto mais forte um povo se visse retratado em suas narrativas heróicas, mais sua auto-estima os levaria a tê-las como inspiração em seu cotidiano e na sua visão de identidade nacional.

No que se refere a força, temos três momentos na narrativa: temos Siegfried (Países Baixos) dominando a situação; em seguida, após sua morte, temos os burgúndios (Reno) e, em seguida, finaliza-se a saga com a vitória dos hunos. Em cada momento distinto da epopéia, temos, pois, um povo diferente que domina a situação. Essa alternância de poder mostra-nos, de certa forma, que ele é perene e é apenas uma questão de tempo para que uma força se sobreponha à outra.

- Darini

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