terça-feira, 15 de junho de 2010

A Triste História de Seu Mané

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Manoel Brasil era um homem comum. Comum até demais. Pobre, vivia fazendo um bico aqui, um bico ali, um trabalhinho extra por indicação... e, assim, ia levando a vida.

Seu Mané, como era conhecido pelas redondezas, não teve chances de estudo. Pelo ofício, até que sabia fazer as operações básicas com certas perspicácia. Lia palavras soltas no ar e escrevia nomes de materiais de construção. Claro, assinava o nome.

Seu Mané não era má pessoa; havia sido preso algumas vezes, mas por conta do atraso no pagamento da pensão de suas 3 ex-esposas. Tinha 9 filhos. Às vezes, conseguia um benefício do governo, mas acabava gastando com farra e cachaça.

Vivia na casa de amigos e parentes até quando era suportado (e, possivelmente, expulso). "Cristão", como se autodenominava, tinha fé de que as coisas melhorariam. "Um dia, Jesus vai melhorar minha vida", dizia.

Adorava ser parte da histeria coletiva em épocas de copa do mundo. Tinha uma leve ideia do que significava "coletiva", não sabia de forma nenhuma o que era "histeria", mas pouco importava. O importante era o Brasil ser campeão do mundo. "Meu país tá no meu nome!" - vangloriava-se. Tocava buzina, soltava rojão, bebia, gritava e chorava com os amigos no boteco. Ajudava na vaquinha pra pintar a rua e comprar bandeirolas. "A pensão das crianças pode esperar." - pensava.

Sentia-se vitorioso, vendo seu time fazer gols. Era como se fosse sua vitória. A única de sua vida. Nada mais importava em seu mundinho, a não ser os lances e resultados vomitados pelo narrador. Às vezes, no meio do programa esportivo, vinha um daqueles caras do jornal da noite, dizendo coisas do tipo: "Crise na Europa causa fuga de capitais do mercado financeiro" ou "Recessão no Japão causa quedas na exportação", mas... nem queria saber o que isso queria dizer.

"Nóis vai ser campeão do mundo, isso que importa!" - gritava e torcia.

Seu Mané ficou entusiasmado. O governo de seu país, mais ainda! O que mais importa para um dirigente é um bando de seres alienados e anestesiados por uma causa inútil. "Panis et circensis" do século XXI. Os césares morreriam de inveja.

Entretanto, para complicar ainda mais a vida de Seu Mané, o Brasil perdeu a copa naquele ano. Sua única chance de felicidade havia ido por água abaixo. Patriota que era, pegou sua bandeira do Brasil e, irritado, rasgou-a em mil pedaços. Com o tanto de tinta que sobrara da pintura da rua, foi destruir a bandeira que lá repousava eternamente.

"Meu país tá no meu nome. Vergonha!" - dizia.

Na entrevista dos jogadores, viu desculpas, sorrisos amarelos e fotos com o presidente. Em seguida, lembrou da propaganda que dizia "Sou brasileiro e não desisto nunca". Foi a deixa para Seu Mané, que voltou a pensar e torcer pelo campeonato, na copa dali a quatro anos.

Seu Mané, o brasileiro.

- Darini

sábado, 5 de junho de 2010

A Canção dos Nibelungos - Parte Final

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Veja aqui a Parte 1 desta análise - A Linguística e a Epopeia

Veja aqui a Parte 2 desta análise - A presença do maravilhoso na construção dos personagens

Veja aqui a Parte 3 desta análise - O Herói


Veja aqui a Parte 4 desta análise - O papel dos personagens femininos


Relação dos personagens com a morte

O cenário é conturbado: a Europa do século VIII ao X, com seus reinos recém-formados, após a queda do Império Romano no século V. invasões, guerras, disputas de (e pelo) poder... tudo isso faz parte do dia-a-dia do herói épico medieval (assim como de todo o povo medieval).

Tal realidade era, certamente, visível aos olhos do(s) autor(es) do poema, quando da sua elaboração, e esses elementos não poderiam deixar de constar nos escritos, uma vez que a literatura nada mais é do que a representação artística da história, vista por aqueles que têm o poder de abstrair os fatos “reais” e transformá-los em “sua história”, com nuances e características próprias. É como uma fotomontagem dos dias atuais: o real está lá, escondido, e cabe àquele que vê a mudança discernir o que existe do mundo “palpável” daquilo que é abstrato, metafórico, ilusório e irreal.

O cavaleiro épico não tinha medo da morte. A glória em morrer como um bravo guerreiro superava qualquer temor de perecer, uma vez que seus atos, sua coragem e sua bravura o conduziam para um destino glorioso - vencendo ou não - pois em ambos os casos ele seria visto como um realizador de benfeitorias, tendo, assim, cumprido seu papel de cavaleiro.

Embora iminente e previsível, a morte de um bravo cavaleiro era lamentada na proporção de sua bravura e feitos. Vemos isto quando da morte de Siegfried e, ao final, da de Rüdiger. Neste último caso, há um grande lamento por partes daqueles que causaram sua morte, principalmente pela forma como ela ocorreu.

É provável que os garotos da época medieval sonhassem em se tornar cavaleiros. Toda a força, “pompa” e grandeza que a imagem representava certamente deveria atrair o fascínio de jovens em todos os cantos da Europa. É o cavaleiro que faz o papel do próprio rei numa batalha; lá, ele o representa, assim como representa seu povo e seu país. É por sua luta que seus senhores expandirão ou diminuirão seu poder, seus territórios. O futuro dos próprios reis e de toda a nobreza dependia da ação cavaleiresca.

A Epopéia - retrato do mundo medieval

A força sobre-humana de certos personagens pode ser vista, ao mesmo tempo, como uma forma de exaltação e auto-afirmação do povo descrito na epopéia., assim como pode representar a dificuldade que um sentimento ligado a estes personagens representa. Por exemplo, Brunhild tem sua força espetacular até o dia de sua primeira noite de amor com Gunther; em seguida, ela parece perder seus poderes. Lembremos, pois, que quando rainha da Islândia, ninguém era capaz de desposá-la e, como conseqüência, perdia a vida. Essa imagem pode ser tomada como uma metáfora da dificuldade da conquista, da realização amorosa e da dificuldade de chegar ao ápice do amor pleno e total.

Em certos aspectos, Brunhild representa a condição da mulher da idade média, pois o fato de ela se entregar apenas àquele que demonstrasse força física superior à sua, leva-nos a crer que ela buscava, na realidade, alguém capaz de dominá-la, como se apenas esse guerreiro e rei fosse capaz de lhe proporcionar proteção e segurança.

Assim, como um país poderoso invade e domina um país mais fraco, da mesma forma um guerreiro mais poderoso a dominaria, mas também seria capaz de lhe fornecer as condições necessárias para seu bem-estar e sobrevivência.

Segundo Campbell, o poeta trovador era o verdadeiro romântico. Ele colocava a mulher num patamar acima, numa posição como a de adoração, sendo seu amor, por muitas vezes, platônico e inalcançável. Isto acontece tanto com Siegfried em relação a Kriemhild, assim como com Gunther em relação a Brunhild. Em segundo plano, quando dos torneios de justas que aconteciam sempre que havia importantes visitantes de um reino em outro, temos as jovens donzelas que almejavam se casar com os guerreiros que mais se destacassem na partida, sendo a recíproca verdadeira: estes davam tudo de si para uma performance satisfatória aos olhos de suas futuras amadas.

A força física servia como uma vitrine de virtudes de um tempo de guerras e conquistas territoriais. Quanto mais forte um povo se visse retratado em suas narrativas heróicas, mais sua auto-estima os levaria a tê-las como inspiração em seu cotidiano e na sua visão de identidade nacional.

No que se refere a força, temos três momentos na narrativa: temos Siegfried (Países Baixos) dominando a situação; em seguida, após sua morte, temos os burgúndios (Reno) e, em seguida, finaliza-se a saga com a vitória dos hunos. Em cada momento distinto da epopéia, temos, pois, um povo diferente que domina a situação. Essa alternância de poder mostra-nos, de certa forma, que ele é perene e é apenas uma questão de tempo para que uma força se sobreponha à outra.

- Darini

quarta-feira, 2 de junho de 2010

A ti, locadora...

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Locadora, Locadora...
a louca dor, a que por ti sinto
é mais cruel do que broxada do pinto!

Era todo dia, lembro, um sacrilégio
E os estudos? Ah... foda-se o colégio
Ver os novos lançamentos, um privilégio
Ficar de próximo no Street...
ah, que ambiente egrégio!

O Ninja Verde? Como habilita?
Tentar o código é o mais lógico
Claro, isso muito irrita
Mas vejam! Sou abençoado!
Explicam tudo no detonado!

Locadora, locadora
A louca dor, a com que padeço
Me faz lembrar as divisórias de gesso
Um novo acessório... um adereço
O pai do playboyzinho compra. Foda-se o preço!

Locadora, locadora
O filhinho e a mãe emperuada
Pra 4 dias? Aproveita, aluga de baciada
Só não vale lançamento, amigão
São 24 horas pra devolução!

- Darini