sábado, 5 de novembro de 2011

Ler Poemas pode ser complicado

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O maior problema que o povo em geral tem ao ler poemas é "esquecer" o verso anterior ao ler o próximo, sendo que, em boa parte das vezes, os versos podem ser lidos como prosa.

O esquema básico para ler QUALQUER poema é identificar:

- onde seriam colocadas as conjunções / conectivos em geral (se não houver) entre os versos;
- identificar prováveis inversões (fuga do esquema sujeito => verbo => complemento);
- "traduzir" as prováveis figuras de linguagem;
- já saber (ou pesquisar) elementos históricos e/ou mitológicos, como na Divina Comédia ou Os Lusíadas. No caso deste, temos:

Os Lusíadas escreveu:
As armas e os barões assinalados
Que da Ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca dantes navegados
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram


Esses 8 versos, acredite você, tem apenas um sujeito: "As armas e os barões assinalados". Ou seja, os complementos estarão (quase que) obrigatoriamente relacionados a ele. Então:

As armas e os barões assinalados passaram além da Taprobana.
As armas e os barões assinalados edificaram.
As armas e os barões assinalados tanto sublimaram.

NESSE CASO, o resto vai ser complemento: advérbios e objetos. Poderíamos, claro, colocar na ordem direta:

As armas e os barões assinalados passaram, da Ocidental praia Lusitana, por mares nunca dantes navegados, ainda além da Taprobana. Esforçados em perigos e guerras, edificaram, mais do que prometia a força humana, e entre gente remota, um novo reino, que tanto sublimaram.

Viram só?

- Darini

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Acordo Ortográfico: Matando Pulga com Canhão

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Não sei por que há tanta discussão e preocupação, por parte da mídia e "escolares", com o Novo Acordo Ortográfico. Da forma como a coisa é colocada, dá-me a impressão de que ele é a salvação do ensino da Língua Portuguesa no Brasil, o que, claro, não é verdade.

O tempo gasto na (estúpida e inútil) discussão do "co-herdeiro" ou "coerdeiro" poderia ser muito mais bem utilizado (e NÃO "melhor" utilizado) em dois temas básicos para um melhor entendimento da Língua: Sintaxe e Semântica.

Sim, meus caros dois leitores: mandar aluno decorar listas e mais listas de palavras nada mais é do que emburrecê-lo, pois é através da Semântica e Sintaxe que ele entenderá a lógica da Língua, as nuances do discurso conotativo e denotativo, as engrenagens que formam a máquina da Língua.

De que adianta saber se é co-axial ou coaxial, se ele não tem ideia do que isso significa? Não se pode dizer que um medíocre (não por própria culpa) escrevendo da forma ortográfica padronizada "sabe mais Português" do que um bom articulador de estruturas linguísticas que, por ventura, venha a desconhecer partes do acordo (ou todo ele).

Sabe aquele contrato cheio de ciladas nas entrelinhas escrito por aquele advogado sanguessuga? A missão do professor é tentar fazer seus pupilos entenderem justamente isso. Da mesma forma, deveriam saber identificar um texto jornalístico malicioso. Ao ler, devem perguntar: "Para que lado o autor quer me levar? Do que quer me convencer?"

É um trabalho difícil, árduo. O Professor de Português deveria trabalhar como um desalienador social, um terror para os políticos! Mas o que fazer, quando o próprio professor teve uma educação primária precária e uma educação superior ineficiente? (parte da) Solução: o ensino reforçado de Semântica e Sintaxe, já que, pela primeira, o aluno entrará em contato com os sentidos das palavras na Língua. Verá, sobretudo, casos em que o uso conotativo de um termo é tão sutil, que o leitor desavisado poderá entendê-lo como oposto àquilo que o autor quis dizer. Na segunda, ele estudará as relações entre Sintagmas.

Numa fala sutil ou irônica, qual o real "lado" do autor? É uma crítica ou elogio ao assunto de análise? Há elementos anafóricos ou catafóricos que ajudam (ou atrapalham) no resgate das ideias e elementos? Os elementos de ligação (conjunções) estão bem empregados?

A educação deve, sim, dar menos importância ao "acento que caiu", como parece estar fazendo a mídia Portuguesa, que insiste em escrever "acção", "objecto" etc. Deveríamos estudar a nova ortografia apenas como apoio, não como item principal. Claro, tudo isso deve ser aquele pequeno (mas importante) percentual de tudo o que deve ser mudado na educação brasileira. Deve-se acabar com o pensamento do "cai no vestibular" (que serve para que, mesmo?), mandando por terra a máfia cursinhos x ENEM x faculdades "de nome" (não existe faculdade boa. Existe faculdade de nome).

Onde trabalho, tive a chance de ministrar um curso chamado "Práticas para um uso competente da Língua Portuguesa", cujo público-alvo eram pessoas da faixa de 40-50 anos. Embora o nome seja pomposo, ele nada mais é do que uma mistura (divertida, até) de Gramática e Técnicas de Redação. Pela idade, todos passaram pelo que chamam de ensino "tradicional", aquele que diz, para o terror das pedagogas, "o professor transmite conhecimento para o aluno".

O mais interessante foi notar que as dificuldades encontradas por eles não seriam muito diferentes daquelas que teriam alunos formados por outros currículos. Parte disso ocorreu, porque muitos já não tinham contato com as "coisas da Língua" há muito tempo. Mesmo assim, a turma me surpreendeu positivamente, já que, realmente, relembrar os conceitos de Regências, Concordâncias e afins pode ser um pouco... chato. Justamente por isso é importante uma base escolar forte: o tijolo (another brick in the wall?) colocado lá atrás é que dará sustentação ao prédio (conhecimento) montado hoje.


- Darini

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Meu e-mail para a Folha de São Paulo

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Tempos atrás, escrevi sobre o inadequado uso da expressão "recomendo(amos) fortemente" (clique aqui para ler). Qual é minha surpresa, quando me deparo com mais um uso dessa forma em um dos "jornalões" - A Folha de São Paulo. Na reportagem "Steve Jobs renuncia à presidência da Apple", lê-se:

"Quanto ao meu sucessor, recomendo fortemente que executemos nosso plano de sucessão com a nomeação de Tim Cook como presidente-executivo da Apple."

Mandei, então, uma mensagem para eles, como segue abaixo:

Há realmente a necessidade de traduzir o "strongly recommend" como "recomendo fortemente", expressão que não existe em Português?

Posso mandar meu currículo para análise? Pelo que escrevem aí, estão "precisando fortemente" de redatores / revisores de texto.
Então... será que mudo de emprego?

- Darini

domingo, 31 de julho de 2011

Os cães não deixavam passar

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Naquele dia, os cães ladravam mais do que o normal
Chovia demais e os trovões torturavam os tímpanos de todas as criaturas
Do nada, todos começaram a correr... corriam, corriam...

Os cães pareciam liderar os demais grupos
Fugiam de quê? Nem eles sabiam
Mas os cães lideravam

Horas, muitas horas depois
Pareciam ter chegado a seu destino
Como não diferente, os cães decidiam quem deveria entrar

Muitos humanos ficaram de fora... para falar a verdade, a maioria deles
Cães, pobres cães, só podiam deixar entrar aqueles que tivessem a virtude
E os humanos não a tinham

Os ferozes leões a tinham
As venenosas cobras, aranhas e escorpiões também
Os elefantes, as capivaras e as raposas tinham, bem como seus primos lobos

Menos os humanos
Malditos, ficavam quase todos do lado de fora
Não ousavam entrar... não mesmo

Os cães é quem decidiam
Impediam, mesmo que fossem velhos inválidos, grávidas ou inocentes crianças
Os cães não deixavam

Os cães viam e sentiam
Por isso, se necessário fosse
Não os deixavam passar

Eles sentiam a virtude
Ou a falta dela
Quem merecia entrar entrava

Humano nenhum ousava burlar a regra
Pois, se o fizesse, era morte certa
Pois os cães não deixavam

A fila diminuía, ao passo que a procissão de humanos...
Ah, humanos malditos
Eles, os cães não deixavam passar

A procissão de humanos errantes aumentava
Iam pra todos os lados, exceto em linha reta
Pois os cães não os deixavam

A chuva caía... os trovões ficavam mais fortes... mais tenebrosos
E os humanos... erravam por itinerários errantes
Será que passarei? Será que passarei?

Os cães... ah, os cães...
Livravam-se de seu câncer
Os cães não deixavam passar...

- Darini

quarta-feira, 18 de maio de 2011

quinta-feira, 28 de abril de 2011

terça-feira, 19 de abril de 2011

As Galinhas da ANAC

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Hoje, deparei-me com uma reportagem bizarra da Folha de São Paulo: "Aeromoça tem que matar galinha e rastejar na lama". Nela, descrevem um estranho curso (exigido pela ANAC) para comissários de bordo em que, dentre demais humilhações, obrigam-nos a matar galinhas.

Pra quem não sabe, a ANAC - Agência Nacional de Aviação Civil (assim como outras agências ditas "regulatórias"), nada mais é do que um cabidão de emprego de incompetentes apadrinhados políticos. E, claro, como as outras agências (ANATEL e afins), eles defendem, no fundo, o direito das empresas, e não dos clientes. Tenta fazer uma reclamação nessas agências e, depois, me conta o desfecho do caso.

Imagino a cena: algum burrocrata, sentado com o bundão na cadeira, jogando paciência e campo minado no PC, aparece com a seguinte ideia: "Ah, vamos exigir um curso de 3 mil reais nos moldes do treinamento do Braddock" - Sim, o curso custa 3 MIL, e o aluno é quem paga.

Tudo bem que uma aeronave pode passar por problemas mais sérios, fazer um pouso de emergência, e a equipe aérea deve estar preparada... mas não creio ser necessário fazer um treinamento em que se torture e mate um animal, apenas pelo fato do sadismo em si, ou para se fazer parecer chocante ao aluno. Ideia cretina de um burrocrata cretino em uma agência cretina. É coisa de gente querendo aparecer e mostrar serviço.

Imagino a seguinte cena:

Piloto: Senhoras e senhores, aqui fala o capitão. Estamos caindo, mas não se preocupem, pois vou procurar aterrisar o avião numa granja ou fazenda. É que aprendemos a matar galinhas em nosso treinamento.

Comissário chefe: Boa tarde, senhores passageiros. Se alguém tiver um forno de micro-ondas na bagagem por favor, queira nos emprestar. É que galinha crua é muito ruim.

Imagino que, depois desta, poderiam mudar o significado de ANAC para "Agência Nacional dos Acéfalos Cretinoides".

Tudo bem ser incompetente (eu também sou, e orgulho-me disso), mas não fodamos com a vida de outros seres vivos por causa de nossa incompetência.

- Darini

domingo, 20 de fevereiro de 2011

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Recomendamos fortemente

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Uma rápida pesquisada no Google nos faz encontrar 45.900 ocorrências para o termo "recomendamos fortemente". Pior ainda, vários sítios de universidades usam tranquilamente tal termo que, provavelmente, é uma tradução direta do "we strongly recommend", de uso comum no inglês.

Antes de mais nada, a palavra recomendar é de interessante análise, como se vê:

Prefixos: {re} = muito; {co} = junto
Raiz: {men} < {man} = usar ou dar a mão

Ou seja, recomendação é "a ação de oferecer a mão a alguém", no sentido de auxiliar outro em relação a um problema ou ação a ser tomada. Ou seja, na própria Raiz da palavra já consta, intrínseco, o "ajudar", "dar uma mão".

Pois, vejamos, se eu recomendo um filme a João, estou ajudando-o em seu programa de entretenimento (segundo minha análise subjetiva, claro). Na pior das hipóteses, até poderia dizer que recomendo muito alguma coisa, mas o "fortemente", em Português, não faz muito sentido, a não ser nas preguiçosas mentes de quem traduz os textos em inglês de forma literal.

E mais: quem traduziria, por exemplo, Ele sentou-se "para baixo"? Em inglês, a tradução literal "He sat down" faz sentido. Da mesma forma, ficaria esquisito Ele caiu "para baixo" (He fell down), já que mais esquisito ainda seria cair para cima.

O que pretendo alertar é: para traduzir um texto, não basta o conhecimento dos idiomas em si. Há de se despejar um pouco de bom senso no trabalho.

- Darini