terça-feira, 28 de julho de 2009
As Raízes Linguísticas da Morte
Única certeza, mas, mesmo assim, um dos maiores mistérios humanos, a morte mostra, linguisticamente, algumas variações nas Raízes cujos significados a ela nos remetem. Segundo Saussure, o pai da Linguística moderna, (2006, p. 216), "[...]chama-se Raiz ao elemento irredutível e comum a todas as palavras da mesma família". Ou seja, é o gene da palavra.
Aplicando isso ao assunto abordado, a Raiz mais usada e conhecida pelos falantes das Línguas Românicas é a Latina {mort}, oriunda do sânscrito {mor}, cujo significado é “falecimento, perecer, destruir”. Todavia, essa Raiz não é exclusividade das Línguas Neolatinas. Ela está presente no inglês mortal {mort}; no croata e esloveno smrtnik {smrt}; no letão mirstīgo {mirst}; no maltês mortali {mort} e no polonês śmiertelne {śmierte}. Obviamente, sendo essas Línguas “descendentes” do ramo Indo-Europeu e sendo a morte um fenômeno que assombra a humanidade desde sua origem, não é surpresa que haja uma Raiz universitária para ele.
As Raízes das Línguas Germânicas, por sua vez, parecem estar mais ligadas ao Grego: {thanat}, oriundas do Gótico dauthus, cujo significado é morte. Essa Raiz se encontra presente no inglês death; no alemão Tod; no dinamarquês e norueguês død; no holandês dood e no sueco död. Nas transformações Linguísticas, é comum a transformação do t em d (t > d). Não se pode dizer que {thanat} tenha originado dauthus, mas é notável que há, sim, uma Raiz ancestral comum a essas duas formas.
Outra forma grega é {necr} (de necrose e suas variantes). Essa Raiz parece ser mais comum tanto às Línguas Neolatinas como às Línguas Germânicas. Está presente no alemão Nekrose; no catalão necrosi; no estoniano nekroos; no francês nécrose; no sueco nekros etc. A influência dessa Raiz atravessou o mundo Indo-Europeu, e foi adotada em idiomas não oriundos desse ramo, como o finlandês nekroosi e o húngaro necrosis.
Mais uma Raiz latina com significado “morte” é {let}, presente em palavras como letal e letalidade. Vale notar que, dentre as Línguas Germânicas, sua forma está presente apenas no inglês lethal. As demais utilizam derivações como na forma do Gótico dauthus. Isso, claro, aconteceu por conta da “transferência” de vocabulário às Ilhas Britânicas, quando da invasão normanda em 1066.
Outra, não necessariamente significando morte, mas, sim, “que causa morte”, é a Raiz Latina {torp} (de torpe, entorpecente, torpedo e suas variantes) e a também Latina {cad}, que quer dizer “cair, perecer”.
A Raiz Indo-Europeia *{ster} "deu origem" (vem sempre entre aspas, quando fizer esse tipo de afirmação, pois, certamente, houve um longo caminho a ser percorrido entre a Raiz e sua derivada) ao alemão sterben, que significa morte literalmente. Também originou a forma latina strangulare que, posteriormente, agraciou o português com seu estrangular.
Se existe o morrer, existe o matar. O Indo-Europeu *{mer} foi a Raiz das formas maúrþrjan do gótico, morden do alemão e murder do inglês. Foi ela que originou o mors latino e suas derivações. Todavia, em Português, "matar" é mais complexo: houve a aglutinação da Raiz latina {magn}, originada pela {meg} grega (a mesma da palavra "mega" = grande), mas, nesse caso, significando "vida", com a Raiz {act}, significando "fazer" ou "levar". Algo como "levar a vida" (sabe-se lá para onde).
É o suicida quem leva a própria vida. Escondida nessa palavra, encontra-se a Raiz latina {cad}, também presente em cadáver e cair, que, por sinal, é o significado desse Morfema. O suicida é, pois, "aquele que faz cair a si mesmo", da mesma forma que o homicida "faz cair o homem" e o inseticida "faz cair o inseto".
Poético é o significado de óbito: {ob} significa espiritual e {it} significa caminho. É o caminho que o espírito pega para seu repouso eterno.
Uma vez mortos, precisamos de um lugar para ficar. Mais especificamente, para deitar. É esse o significado da Raiz latina {jac}, de jazer (do famoso "aqui jaz...") e o jazigo propriamente dito.
- Darini
quarta-feira, 22 de julho de 2009
Tem só aqui neste andar?
Passeava eu pelo shopping, quando um homem, ao validar o cartão do estacionamento, perguntou exatamente isso à atendente:
- Tem só aqui neste andar?
- Como assim? - a mulher respondeu.
- Digo... tem outro lugar para pagar?
- Sim, bláblábláblá...
Se fosse um texto escrito, no lugar da fala, essa mesma ambiguidade poderia ter sido esclarecida com uma vírgula. Ao perguntar "Tem só aqui neste andar?", o homem pode dar a entender que "aqui" e "neste andar" são a mesma coisa. A vírgula entraria para separar dois Sintagmas diferentes:
"Tem só aqui neste andar?" significa "em todos os andares, só existe este local para o pagamento do cartão". O "aqui neste andar" é um só Sintagma, um Adjunto Adverbial de Lugar único. No fundo, "neste andar" é aposto de "aqui".
"Tem só aqui, neste andar?" significa "neste andar, tem só aqui para pagar o cartão, mas pode haver outros lugares em outros andares". O "aqui" e "neste andar" são dois Sintagmas distintos (por isso, há o uso da vírgula para separá-los).
Entretanto, alguns podem rebater dizendo: "não é o contrário? A vírgula não serve para explicar ou funcionar como aposto, como pode acontecer numa Oração Subordinada Adjetiva?" - Sim, respondo. Mas veja como, analisando a segunda oração, é possível deslocar o Sintagma, justamente por causa do uso da vírgula:
"Neste andar, tem só aqui?"
"Tem, neste andar, só aqui?"
"Tem só, neste andar, aqui?" - construção mais estranha, mas correta.
O "passeio" que o Sintagma "neste andar" pode fazer pela oração, quando do uso da vírgula, indica sua clara independência em relação ao "aqui" (sendo a recíproca verdadeira), o que acaba por reforçar a análise inicial.
- Darini
domingo, 19 de julho de 2009
The Tudors

The Tudors é uma série histórica baseada na vida do rei Henrique VIII da Inglaterra (28 de Junho de 1491 — 28 de Janeiro de 1547), membro dessa dinastia. Produzida por Irlanda e Canadá, mostra os mandos e desmandos do monarca (essa foto é uma ótima metáfora para explicitá-los) e o quão perigoso pode ser o poder, se colocado nas mãos de uma pessoa apenas.
Henrique VIII foi o pai de Elisabeth I (também chamada Isabel) - aquela que, provavelmente, foi a maior monarca britânica. Foi ele que rompeu com a igreja católica, pois esta negava-se a lhe conceder um segundo matrimônio (parte do enredo mostra as tentativas de seu primeiro-ministro e conselheiro, o cardeal Wolsey, em obter autorização papal para o divórcio). Não obtendo sucesso, ele funda a igreja anglicana (Church of England), da qual torna-se líder supremo.
Para saber mais sobre a série: http://pt.wikipedia.org/wiki/The_Tudors
Sobre Henrique VIII: http://pt.wikipedia.org/wiki/Henrique_VIII
- Darini
sábado, 18 de julho de 2009
Religião é "religar"?
Clássico: basta alguém começar a filosofar sobre religião, e a máxima "religião significa religar" aparece. Será? Façamos uma Análise Morfológica da palavra:
Prefixo: {re}, que significa "muito"
Raiz: {lig} < {leg} = reunião - mesma raiz de "legião", "legionário"
Sufixo: {ão} = significa "ação"
Interessante notar que {lig} também pode significar "ler". Nada absurdo, se considerarmos que, em muitos rituais religiosos, há sempre algum tipo de leitura - que, necessariamente, não precisa ser de um texto (metaforicamente: "leitura" da humanidade, leitura da essência humana etc).
A própria Revista Língua, em sua edição especial "Religião e Linguagem" (muito boa por sinal; vale a pena uma lida) diz:
A própria palavra "religião" é ela mesma um desafio de linguagem. Ela viria de religio, que os romanos antigos consideravam ser a raiz de relegere (retomar com cuidado, avaliar com calma) [...] e nos primeiros séculos depois de Cristo suspeitavam derivar de religare (unir, religar).
É muito provável que o significado popular de religar tenha nascido com o cristianismo, pois, segundo essa crença, foi Cristo que teria "religado" a humanidade com o criador.
Fugindo do campo da Análise Linguística, apresento outro significado, tomado do "The Devil's Dictionary" ("Dicionário do Demônio", em tradução livre), de Ambrose Bierce:
RELIGION, n. A daughter of Hope and Fear, explaining to Ignorance the nature of the Unknowable.
(Religião: uma filha da esperança e do medo, que explica à ignorância a natureza do desconhecido).
- Darini
segunda-feira, 13 de julho de 2009
A Morte e a Filosofia
Diz Nietzsche:
"Abstração feita das exigências que a religião impõe, pode-se muito bem perguntar: por que haveria mais glória para um homem que envelheceu, que sente o declínio de suas forças, ficar esperando seu lento esgotamento e sua dissolução do que ele próprio fixar, em plena consciência, um fim? O suicídio é, neste caso, um ato de todo próximo e de todo natural que, enquanto triunfo da razão, deveria, equitativamente, suscitar respeito: e até o suscitou naqueles tempos em que os guias da filosofia grega e os mais corajosos patriotas romanos costumavam morrer por suicídio.
Pelo contrário, é muito menos respeitável a ânsia de se prolongar de dia para dia por meio da inquieta consulta dos médicos e o mais penoso regime de vida, sem forçar para chegar mais perto do próprio termo da vida.
As religiões são ricas em expedientes contra a necessidade do suicídio: é um meio para se insinuar junto daqueles que estão apaixonados pela vida."
Bem dito. Os guerreiros de diferentes culturas se suicidavam por causa "da honra" (como os samurais) ou se entregavam espontâneamente à morte (como amplamente "documentado" pelas literaturas). A entrega espontânea à morte não deixa de ser, de certa forma, um modo distinto de suicício, mas com menos culpa do que aquele em que o executor e o condenado são as mesmas pessoas. Perdi a batalha com meu inimigo? Sem problemas, entrego-me à morte pelas mãos deles. Meu reino foi invadido, saqueado e destruído por forças invasoras? Da mesma forma, deixo deliberadamente que estes invasores façam minha sentença.
O ato de se entregar à morte é mais um gesto de coragem, ao mesmo tempo que traduz o medo da incerteza das consequências vindouras, caso esse ato não tivesse sido tomado. Vale mais, na forma do pensamento heroico, morrer nobremente a ter que passar o resto dos dias humilhado pelas forças dominantes.
O mesmo pode-se dizer do "morrer por uma causa", que não deixa de ser um ato de suicídio. O ato de entregar a vida a essa causa a torna mais digna, mas séria, mesmo que o suicida, obviamente, não esteja mais lá para presenciar se obteve sucesso. Todavia, isso não importa, pois a paixão e a cegueira o dominam, e ele entrega sua própria vida com prazer e orgulho.
- Darini
sexta-feira, 3 de julho de 2009
A estapafúrdia gramática da Microsoft

O corretor de texto do Word é uma ferramenta que tange a incompetência do conhecimento da Língua Portuguesa e o ridículo. Uma vasta gama dos "erros" por ele indicados e suas supostas correções são de total ignorância.
Vamos, então, aos "erros" apontados pelo programa. Para esta análise, tomei emprestado o "manual DSS", da prefeitura de São Paulo, disponível no site: www.prefeitura.sp.gov.br/manualdss .
1- MÓDULO MEDICINA E SEGURANÇA NO TRABALHO (toda a expressão está sublinhada). Para correção, ele dá as seguintes opções:
- Módula Medicina e Segurança no Trabalho;
- Módulos Medicina e Segurança no Trabalho;
Ou seja, no primeiro caso, o programa entende "Módulo" como um adjetivo, que, seguido de um substantivo feminino (Medicina), deve ser declinado como tal. Na segunda opção, a coisa é menos grave, mas ele entende que se tratam de dois módulos: um de medicina e outro de segurança, tendo que se colocar no plural.
Outro caso muito comum é quando o corretor simplesmente parece não saber o que está errado. Ele grifa uma determinada expressão, e, quando colocamos o cursor para que se verifiquem as opções, lê-se "(Sem Sugestões)". Um exemplo:
2- “É de responsabilidade da chefia, no prazo máximo de 72 (setenta e duas) horas, a emissão da Comunicação de Acidente do Trabalho”. - Neste caso, a sentença "72 (setenta e duas) horas, a emissão" vem sublinhada, mas não conta com nenhuma ajuda do corretor para corrigi-la.
Mais um problema no entendimento morfológico das palavras vem em:
3- “Servidor obteve nexo causal e alta médica do afastamento, mas necessita novamente de licença por causa da mesma doença. Como agendar a perícia?”
Aqui, é grifada a parte "nexo causal e alta médica do afastamento" e, como correção, ele nos apresenta o inimaginável:
"Nexo causal e alto médica do afastamento".
Nesse caso, o coitado ficou desnorteado: provavelmente, não consta a palavra "alta" em seu dicionário, e o mais óbvio a se fazer foi associá-la a "causal", provavelmente por causa da conjunção "e" na sentença.
Concordância também não é o forte do programa. Vejamos:
4- Em "Os pedidos devem sempre ser acrescidos...", é indicado que se deveria ter escrito "Os pedidos devem sempre ser acrescido...", ou seja, parece que o programa "pensou" ser esta uma sentença como "Eles haviam cantado"; em que há um particípio precedido de um verbo auxiliar, o que não é o caso ("acrescidos", nesse caso, é puro adjetivo, e deve concordar mesmo com "pedidos").
O engano também ocorre, quando há a tentativa de reconhecer a função morfológica da palavra, como em:
5- "(o sevidor)... Anexa relatório médico atual, cópia simples do RG, CPF e último holerite". A correção indicada pelo programa é "Anexo relatório...", o que mostra mais um erro na idenficação da função, pois trata-se do verbo conjugado na 3ª pessoa do singular, e não um adjetivo, como diz ser o programa.
Esses foram apenas alguns casos de uma infinidade que podemos elencar. Um outro bastante clássico é quando o corretor confunde uma Oração Adjetiva com o predicado, como no caso:
6- "João, que gosta de caramelo, comeu goiabas". Nesse caso, aparece a máxima: "não se separa, com vírgula, o sujeito do predicado". Não programaram o corretor para identificar apostos ou orações adjetivas.
Em suma, parece que o pessoal da Microsoft é muito bom nas linguagens de computação, mas peca demais na Portuguesa. O que mais assusta é a quantidade de pessoas que vejo, após a digitação de um memorando ou documento qualquer, verificar a gramática com esse falho corretor. Ou seja, tornam seus textos "mais errados" após a correção.
Programadores da MS: qualquer coisa, liguem para mim!
- Darini
quinta-feira, 25 de junho de 2009
A culpa é do professor!
- A culpa é do professor! - diz a indignada mãe.
- Ele é o culpado! - diz a mãe e o juiz.
- Tranquem-nos nos calabouços! - diz a mãe, o juiz e o jornalista.
- A culpa é deles! - gritam os leitores dos jornais.
- Isso tem de mudar. Fiz um projeto de lei... - promove-se o "nobre" deputado, pouco antes da próxima maracutaia.
- Vamos fazer greve! - comemoram os alunos.
Assim, acaba o dia. A mãe vai para casa assistir novela, o juiz vai para um caro restaurante (com carro oficial) comer de graça, pois dá sua carteirada, o jornalista vai fazer o resumão das fofocas semanais sobre celebridades, os leitores vão consumir essas fofocas, os deputados vão fazer suas mazelas e os alunos...
Ah, os alunos... vão continuar culpando o professor...
- Darini
terça-feira, 23 de junho de 2009
Um pedido inesperado...
ACM: Por favor, traz o Sarney pra cá, tem como, meu rei? Eu me sinto tão sozinho...
Capeta: Não dá! Tá ficando louco? Já falei pra você fazer amizade com o Roberto Marinho.
ACM: Você é que tá doido! Não vou me juntar àquele cara, não!
Capeta: Olha aqui: já tem gente demais querendo mandar nessas profundezas. Não preciso de mais um coronel nesse exército.
ACM: Mas eu divido minhas coisas com ele... juro!
Capeta: Já disse que não! Ainda preciso ver espaço pra um monte de gente que tá na fila de espera: Fidel, Maluf, Bush pai, Bush filho... o Sérgio Naya ficou de me entregar o projeto do puxadinho, mas, até agora, nada!
ACM: Quanto você quer para trazer ele pra cá?
Capeta: Como assim?
ACM: Eu pago o que você quiser pra trazer o Sarney pra cá!
Capeta: HAHAHA! Seu dinheiro não vale nada aqui.
ACM: Hmmm... então, tem como trazer o David Gilmour do Pink Floyd? Ia bem um sonzinho aqui... algo psicodélico...
Capeta: Não dá. Ele é ateu. Ateus não vêm pro inferno.
ACM: Não? Pra onde vão?
Capeta: Pro paraíso.
ACM: O quê? Não tem algo de errado com isso? Eu sempre acreditei em deus!
Capeta: A ideia é essa! O povo que, em vida, só acreditava vendo, vai ver depois de morto. Os que já acreditavam... não precisam ser convencidos. Fora isso, convenhamos: você, ACM, queria ir pro céu? Faz-me rir!
ACM: Quer dizer que o Fernando Henrique vai pro céu?
Capeta: Vai.
ACM: E o Lula?
Capeta: Ah, esse tá no meio de uma discussão lascada. O paraíso quer mandá-lo pra mim, mas eu não quero esse cara por aqui, não. Deve ficar por lá um bom tempo, até que se resolva o impasse. Imagina só: "nunca antes na história desse inferno..."
ACM: Espera um minuto: você disse que o Fidel vai vir pra cá, mas ele não é ateu?
Capeta: Sim, mas ele é comunista. E todo comunista vem pro inferno, acredite em mim...
- Darini
quinta-feira, 18 de junho de 2009
Os narradores de “Dois Irmãos” e “O Apanhador no Campo de Centeio”
Em “O Apanhador no Campo de Centeio”, o escritor norte-americano J.D. Salinger nos conta a peregrinação de Holden Caulfield, um adolescente burguês dos anos 40/50 que é expulso do notório colégio Pencey (o último dentre outros de que já havia saído) e tenta esconder esse fato de seus pais, adiando sua chegada em casa. Na verdade, esse “adiamento” de seu retorno ao lar é que causa toda a peripécia da história e os conflitos vividos por Holden nesse difícil e conturbado período da vida humana.
Já em “Dois Irmãos”, de Milton Hatoum, Nael é pobre e filho da empregada da família, Domingas, e desconhece quem seja seu pai. No entanto, a trama acontece no mesmo período do Apanhador (anos 40/50).
Em relação aos ambientes vividos pelos narradores, o primeiro mostra a cidade de Nova Iorque sempre de acordo com seu ponto de vista; já em Dois Irmãos, o narrador faz uma detalhada descrição de Manaus, sua cidade natal, mas, embora viva “in loco” a maior parte das tramas, outra lhe era contada por Halim ou por Domingas. De certa forma, podemos dizer que, nesta trama, toda a história é contada a partir do ponto de vista do narrador, já que ele reproduz o que ouviu de outros, dando a sua versão e seu entendimento dos fatos.
A perda de identidade é distinta, mas presente em cada obra: em “O Apanhador no Campo de Centeio”, o protagonista-narrador procura sua identidade pessoal, psicológica. Ele faz o tipo “adolescente rebelde” ou “rebelde sem causa”, mesmo sendo de uma família de posses. O problema de Holden é a conflituosa relação dele com o mundo e tempo em que vive: ele não se identifica com nenhum outro tipo de personagem a não ser com sua irmã mais nova, Phoebe (podendo representar a inocência) e com um irmão já falecido, de quem guarda muitas saudades (Allie). Neste caso, a identificação pode se dar por causa do sentimento da perda do ente querido, pois o ser humano tende a guardar apenas as boas memórias daqueles que já se foram. Uma das partes mais bonitas e tocantes do livro é aquela em que Holden tem medo de atravessar a rua, pois imaginava-se caindo antes de chegar ao outro lado. Então, dizia ao irmão: “Allie, não me deixa desaparecer” e, ao cumprir sua meta, agradecia-o.
A busca da identidade dentro de si mesmo, a repulsa dos padrões desse mundo e a identificação pela inocência pode ser vista na cena em que o jovem imagina-se num enorme campo de centeio, com milhares de crianças correndo, e sua missão seria a de não deixá-los cair no abismo. Ele seria “O Apanhador no Campo de Centeio”, aquilo que realmente queria fazer na vida. Podemos ver essa “cena” como uma metáfora para o que ele buscava: a liberdade.
Já em “Dois Irmãos”, Nael busca sua identidade cultural e genealógica: sabe apenas quem é sua mãe, mas tem dúvidas em relação à paternidade. Embora ele (e o leitor) possam acreditar 98% que Omar seja seu pai por conta da violência cometida contra a empregada, ainda nos resta uma sombra de dúvida antes de afirmarmos com certeza de quem ele descende.
Uma coisa chega mais perto aos 100% de certeza: sua origem é uma mistura indígena e árabe, uma vez que os principais “suspeitos” são os da família de Halim. Mesmo que não houvesse essa dúvida em relação à paternidade ser de um dos três, podemos afirmar categoricamente que a cultura a que Nael foi submetido foi uma mistura das supracitadas, uma vez que ele conviveu nesse meio. O ambiente (Manaus) influenciou na cultura do imigrante (árabe) e essa influência será passada àqueles que convivem nesse meio.
Assim como Holden procurava a liberdade, Nael também o faz. Uma vez que a descoberta de sua paternidade se encerra e, se fosse ele um membro daquela família, sua condição de empregado se elevaria à de membro da família, além de que a descoberta lhe traria liberdade espiritual e psicológica, uma vez que a maior dúvida, o segredo que mais lhe intrigava, estaria solucionada.
Ao final da trama (mais especificamente nas duas últimas páginas), o narrador parece ter “canalizado” seus sentimentos para que a liberdade viesse de outra forma: no encontro final deste com Omar, não há diálogo: ambos apenas se encaram, até que o segundo vai embora. Esse silêncio de ambos, principalmente por parte de Nael, pode significar que ele deixou de querer saber a verdade, pois esta poderia lhe trazer mais sofrimento do que a dúvida, pois certos de que Nael e Omar não se gostavam, a certeza da condição pai e filho entre eles poderia resultar num desfecho mais trágico entre os dois; portanto, a eterna incerteza da verdade era o sinal de sua liberdade.
- Darini
quinta-feira, 11 de junho de 2009
O "chocante" empalamento
Dando uma olhada em reportagem da Folha de São Paulo, notei que mais um livro didático teve de ser recolhido, desta vez no Rio de Janeiro, pois seu conteúdo foi considerado "inadequado" para a faixa etária a que era destinado. O motivo? Continha uma gravura de empalamento. Mas, antes, vamos analisar morfologicamente a palavra empalamento:
Prefixo: {em} = dentro
Raiz: {pal} = instrumento de madeira ou ferro.
Sufixo: {am} = efeito da ação; {ento} = aumento
Traduzindo: é o aumento do efeito da ação de um instrumento de madeira ou ferro dentro. Ai! Isso deve doer!
Mas é isso mesmo: empalamento é aquela técnica de tortura que consiste em transpassar uma vara de madeira desde o ânus até a boca de um condenado. Várias civilizações antigas a utilizavam e, provavelmente, a figura mais ilustre a adotá-la foi o conde romeno Vlad III (nosso querido Drácula).
Entretanto, não é a isso que quero me ater. Juro que não entendo essa facilidade com que "imprensa" (mais essa, talvez) e "sociedade" ficam tão chocadas com certas coisas. Ligue a televisão, veja um filme que esteja passando às 8 ou 9 horas da noite. A probabilidade de se achar violência gratuita (entre tiros, sangue e guerras) em filmes é grande. Nem vou citar a meia-dúzia de programas sensacionalistas que mostram "a realidade". Tudo ali, ao alcance de um botão do controle-remoto. Depois, ligue na novela, mas não se assuste, se seu filho de 10-12 anos fizer algum comentário do tipo: "nossa... como eles trepam mal".
E é o empalamento que os choca! Rá, rá, rá!
- Darini
segunda-feira, 8 de junho de 2009
sábado, 6 de junho de 2009
MUTO
Interessante:
http://www.blublu.org/sito/video/muto.htm
O cara faz animações em paredes "engrafitadas". É isso que devemos chamar de arte urbana.
Juro que queria ter o dom do desenho e da pintura (mal e porcamente, tenho o da escrita... e olha lá).
Vendo esse vídeo, dá pra sentir a solidão e o caos da metrópole (seja ela qual for). Muito bom.
- Darini
domingo, 31 de maio de 2009
Sociedade em "Memórias Póstumas de Brás Cubas"
Em seu "Memórias Póstumas de Brás Cubas", Machado de Assis mostra um pouco da sociedade da época, criticando-a principalmente. Vale lembrar que Brás Cubas é um solteirão que busca o ápice da carreira política, e para que seja “bem visto” e “aceito”, deve ser casado.
Tratando-se da sociedade da época, Brasil-império tendo Rio de Janeiro como capital, os tipos nada se diferem daqueles do romantismo. O que faz a diferença é o modo como são mostrados e a crítica que Machado de Assis faz a suas ações. Algumas críticas que Machado faz à sociedade são:
Cap. 24 – Curto, mas alegre: Ao falar da “franqueza” de um defundo, Brás Cubas comenta: “Na vida, o olhar da opinião, o contraste dos interesses, a luta das cobiças obrigam a gente a calar os trapos velhos, a disfarçar os rasgões e os remendos, a não estender ao mundo as revelações que faz à consciência...” – aqui podemos ver sua crítica à máscara social da época, pessoas fingindo ser o que não são escondendo seus defeitos e de outros, apenas para se sobressair perante a sociedade.
Cap. 31 – A Borboleta Preta: Em seu quarto, Brás Cubas é surpreendido por uma borboleta preta (pela superstição popular, traz má-sorte). Ele a sacudiu, ela pousou na vidraça; ele repete o gesto, ela pousa no quadro com a foto de seu pai. O personagem sente-se incomodado com o inseto, atira-lhe uma toalha e ele cai agonizante, em seguida morre.
Neste momento, Brás Cubas faz uma interessante análise do porquê de a borboleta estar ali e querer permanecer no local, como se ele fosse o “criador das borboletas”, e termina com a fala: “... não, volto à primeira idéia ; creio que para ela era melhor ter nascido azul”.
Ora, tendo Machado vivido numa época de escravidão, e sendo ele filho de uma negra, podemos deduzir que aqui ele usa metaforicamente a imagem da borboleta preta para dar sua crítica à escravatura. O “para ela era melhor ter nascido azul” pode ser traduzido, para a situação da época “era melhor ter nascido branco”, uma vez que a situação dos negros escravos no Brasil era desumana.
Cap. 68 – O Vergalho: Novamente, Machado faz uma crítica (mais aberta) contra a escravidão. Brás Cubas andava pelas ruas e vê um negro punindo outro com um vergalho. Ele se aproxima e percebe que aquele que pune, era escravo e fora solto, no passado, pelo pai de Brás Cubas. Eles se reconhecem, e Brás diz a ele que pare de punir o escravo; é prontamente atendido. A crítica também vai ao próprio negro que era livre, e que por uma razão ou outra arrumava para si um escravo, tratando-o da mesma forma como um senhor fizera com ele.
Cap. 84 – O Conflito: Machado critica o “acreditar por acreditar”, principalmente em relação ás crendices populares. Dona Plácida diz que um sapato não podia estar “voltado para o ar”, pois fazia mal. Ele diz: “Disseram-lhe isso em criança, sem outra explicação, e ela contentava-se com a certeza do mal. Já não acontecia a mesma coisa quando se falava em apontar uma estrela com um dedo; aí sabia perfeitamente que era caso de criar uma verruga”.
Cap. 123 – O Verdadeiro Cotrim: “... é indispensável casar, principalmente tendo ambições políticas. Saiba que na política, o celibato é uma remora.” – ele mostra que o político bem-sucedido deveria mostrar à sociedade seu sucesso no plano familiar, mesmo que fosse apenas para manter as aparências.
Cap. 145 – Simples Repetição: Brás Cubas já faz uma crítica aberta ao famoso “golpe do baú”. Neste capítulo, Dona Plácida de como dote 5 contos de réis a um sujeito que dela se fingira enamorado. Casaram-se e, depois de um tempo ele vendeu as apólices e fugiu com o dinheiro.
Quincas Borba é um personagem muito interessante, pois mostra o tipo de pessoa que acredita em algo, constrói uma filosofia de vida e vai até o fim com seus planos, sejam eles certos ou não, tragam-lhe benefícios ou não. No começo ele se mostra pobre, trabalha sobre sua tese do “Humanitismo” que, conforme dizia, era a religião do futuro, recebe herança de um tio e termina a história novamente pobre, mas desta vez ele enlouquece, morrendo dessa forma.
Talvez a figura de Quincas seja também uma crítica de Machado ao fanatismo a alguma teoria ou religião, ou ao trabalho excessivo que leva à moléstia (Quincas pensava freqüentemente em suas teorias, tendo sempre uma resposta a tudo usando seus preceitos).
- Darini
domingo, 24 de maio de 2009
Minha carta de suicídio
Interessante como a esmagadora maioria dos suicidas tem, necessariamente, de deixar uma carta explanando os motivos que a levaram a realizar tal feito. Analisando por alto, creio que a carta significa algo como: "olha, eu não morri acidentalmente, nem de causas naturais, tampouco fui assassinado por alguém. Se ainda resta sombra de dúvidas, saibam que eu mesmo me matei".
É esse (a grosso modo) o objetivo da carta de adeus. Entretanto, descrever as razões que levaram a pessoa ao suicídio cabe somente ao suicida em questão. Jogar a culpa em alguém é uma boa, pois, do ponto de vista do acusado, saber que fomos culpados pela desgraça de outro, acaba por nos deixar num estado-de-espírito extremamente abalado.
Como seria minha carta de adeus? Eu, se me suicidasse, diria sem mais delongas:
"Tô de saco cheio, e a culpa é de TODOS vocês. O último que sair, apague a luz."
- Darini
sexta-feira, 22 de maio de 2009
A Língua Portuguesa é machista?
Não, caro leitor, a Língua Portuguesa não é "machista" (independente do fato de seus falantes o serem ou não). A regra é clara: diz mais ou menos que "quando há um grupo de seres de gêneros diferentes, devemos nos referir a eles pela declinação - chamemo-la assim - masculina". Isso acontece praticamente sempre no plural e, muitas vezes, no singular (veja como comecei o texto). O que fazemos, mesmo que inconscientemente, é aplicar, à construção, uma função NEUTRA mascarada de masculino.
Vejamos: muitas línguas, até hoje, mantém o gênero neutro em suas palavras. O inglês deve ser o mais notório, mas, nele, a coisa é fácil: rezam que "tudo o que é animal ou objeto é neutro". Exceções vão para animais de estimação ou navios grandes (que são femininos). O Latim tinha seus substantivos neutros, o alemão moderno os tem, o russo etc. Nos idiomas neolatinos, mantivemos apenas alguns resquícios do caso neutro. As palavras "isto", "aquilo" e "tudo" são espólio do neutro latino.
Historicamente, indo a tempos mais remotos do que o Latim, o gênero neutro deve ter surgido no ramo Indoeuropeu pela seguinte lógica: objetos de uso masculinos terão a declinação masculina, de uso feminino terão a declinação feminina e os de uso comum serão neutro. Simples, né? Sim, se considerarmos uma sociedade extremamente dividida no que concernia às funções específicas de cada gênero.
Acontece que, com o passar dos séculos, o gênero dos substantivos (no caso) perdeu essa ligação com o gênero daquele que "o possuía", e passou a ser considerado masculino, feminino ou neutro apenas por sua desinência final. Mais tempo passou, e o neutro foi sendo inutilizado. A declinação das palavras deste gênero foi se confundindo com as do masculino, fazendo com que a maioria das palavras neutras do Latim se tornassem masculinas no Português (e demais Línguas românicas).
No alemão, ao contrário, o artigo utilizado para o plural é o mesmo que o feminino singular. Portanto, se traduzirmos "Die Männer" (os homens) literalmente, teríamos "A" homens. Seria o alemão uma língua feminista?
Por outro lado, geralmente em discursos políticos recheados de demagogia, ouvimos construções como "Nobres deputados e deputadas" ou "Queridos professores e professoras", como se fosse extremamente necessário ressaltar que há um público de homens e mulheres em determinado auditório. Bobagem.
É por isso, leitoras, que as trato como "queridos leitores". Falta-me a desinência neutra para satisfazer aos afãs de ativistas mais exaltados (ou exaltadas?)
- Darini
quarta-feira, 20 de maio de 2009
Humor em "Memórias Póstumas de Brás Cubas"
A obra “Memórias Póstumas de Brás Cubas” é repleta de um humor sarcástico, típico de Machado de Assis. Nesta obra, o autor (que se confunde com o personagem) brinca com a morte, já no prefácio vemo-lo dedicando as memórias ao primeiro verme que lhe roer as frias carnes do cadáver. Seguem alguns trechos em que podemos ver o toque de humor de Machado:
Cap 7 - O Delírio: neste capítulo, Brás Cubas relata como foi seu próprio delírio, dizendo que primeiramente tomou a forma de um barbeiro chinês que escanhoava um mandarim. Este, lhe pagava o serviço com beliscões e confeitos. Em seguida, transformou-se na Summa Theologica de São Tomas, e em seguida, tornando à forma humana, foi com um hipopótamo que o leva ao princípio dos séculos, ao Éden.
Cap 26 - O Autor Hesita: Averso ao casamento, Brás Cubas tem um diálogo com o pai, que lhe arranjara uma noiva:
“... quanto à noiva, deixe-me viver como um urso, que sou.”
- Mas os ursos casam-se, replicou ele.
- Pois traga-me uma ursa. Olhe, a Ursa Maior...
Cap 33 - Bem-Aventurados os que não descem: Ele se pergunta o porquê de Eugênia ser uma mulher tão atraente e bonita e, ao mesmo tempo, ser coxa. “... Por que bonita, se coxa? Por que coxa, se bonita?”
Cap 49 - A Ponta do Nariz: Brás Cubas filosofa sobre o “vencer na vida” e a ponta do nariz; sobre o faquir que olha para a ponta de seu nariz para que veja a luz celeste. Termina com: “... há duas forças capitais: o amor, que multiplica a espécie, e o nariz, que a subordina ao indivíduo. Procriação, equilíbrio.”
Cap 71 - O Senão do Livro: Segundo o autor, há nele o arrependimento de ter escrito o livro, pois este “é enfadonho, cheira a sepulcro...” porém, diz que o maior defeito do livro é o leitor, que tem pressa de envelhecer, ao passo que o livro anda devagar, e compara seu estilo de escrever como o ébrio, que ora vai à esquerda, ora à direita, para chegar num lugar.
Cap 92 - Um Homem Extraordinário: Machado usa o humor para criticar a política: “Saíra do Rio de Janeiro, por desacordo com o Regente, que era um asno, pouco menos asno do que os ministros que serviam com ele.”
Cap 103 - Distração: Brás Cubas nos ensina um modo de recear encarar os olhos de outrem: “Lembra-me que desviei o rosto e baixei os olhos ao chão. Recomendo este gesto às pessoas que recearem encararem a pupila de outros olhos. Em tais casos, alguns preferem recitar uma oitava dos Lusíadas, outros adotam o recurso de assobiar a Norma; eu atenho-me ao gesto indicado; é mais simples, exige menos esforço.”
Ainda neste capítulo, ele relata como tirou uma mosca, com uma formiga agarrada à sua pata, do brinco de Virgília que caíra ao solo: “... então eu, com a delicadeza nativa de um homem de nosso século, pus na palma da mão aquele casal de mortificados, calculei toda a distância que ia da minha mão ao planeta Saturno, e perguntei que interesse podia haver num episódio tão mofino.” E ao salvar os dois insetos, termina com: “E Deus viu que isso era bom, como se diz na Escritura”.
Cap. 130 - Para Intercalar no capítulo 129: Aqui, Machado escreve todo o capítulo e termina dizendo: “Convém intercalar este capítulo entre a primeira oração e a segunda do capítulo 129”. De fato, se o fizermos, veremos que este capítulo inteiro encaixa-se perfeitamente onde o autor sugere.
Cap. 136 - Inutilidade: Todo o capítulo é apenas um devaneio do autor; nele apenas há: “Mas, ou muito me engano, ou acabo de escrever aqui um capítulo inútil.”
Cap. 138 - A um crítico: Brás Cubas dirige-se a um crítico que por ventura possa estar lendo suas memórias, dizendo que “seu estilo já não é tão lesto como nos primeiros dias”, isto é, em cada fase da narração de sua vida, ele experimenta a sensação correspondente.
Cap. 139 - De Como Não Fui Ministro d'Estado: Talvez por nem ele mesmo saber os motivos da questão que intitula o capítulo, Brás Cubas o preenche com pontilhados, como que se deixasse ao leitor a resposta para aquilo.
- Darini
domingo, 17 de maio de 2009
GREAT ARE THE MYTHS - poema de Walt Whitman
GREAT ARE THE MYTHS. Leaves of Grass (1867)
http://www.whitmanarchive.org/published/LG/1867/poems/139
Great are Adam and Eve—I too look back and accept
them;
Great the risen and fallen nations, and their poets,
women, sages, inventors, rulers, warriors, and
priests.
2 Great is Liberty! great is Equality! I am their
follower;
Helmsmen of nations, choose your craft! where you
sail, I sail,
I weather it out with you, or sink with you.
3 Great is Youth—equally great is Old Age—great
are the Day and night;
Great is Wealth—great is Poverty—great is Expres-
sion—great is Silence.
4 Youth, large, lusty, loving—Youth, full of grace,
force, fascination!
Do you know that Old Age may come after you, with
equal grace, force, fascination?
5 Day, full-blown and splendid—Day of the immense
sun, action, ambition, laughter,
The Night follows close, with millions of suns, and
sleep, and restoring darkness.
Neste poema, Walt Whitman "equaliza" tudo na vida: as grandes nações emergentes com as decadentes, os poetas, sábios, guerreiros... em uma poesia repleta de antíteses, que são sempre chamadas de "grande", Walt parece celebrar a grandeza da vida, mesmo com sua inconstância para melhor ou para pior (que nos leva a vencer ou aprender a superar obstáculos). Tratando da estrofe 5:
"Dia desabrochado e esplêndido... dia de Sol imenso, de ação, de ambição e risadas,
A noite segue de perto, com milhões de sóis, e sono, e treva restauradora".
Transcedentalista, Whitman descreve o dia como que falando da beleza do viver, cheio de alegria; ao mesmo tempo, fala da morte (a noite), que sempre acompanha a vida e traz consigo a "treva restauradora" (o suspiro final, ou descanso eterno). Além disso, a restauração nos sugere um novo acordar, que pode significar o despertar para uma nova vida nesse mundo ou um despertar espiritual num mundo novo e desconhecido.
- Darini
segunda-feira, 11 de maio de 2009
Fim de férias...
Pegar o infeliz que inventou o "dia útil", o que inventou o "horário comercial" (deve ter sido o mesmo) e enforcá-los com as próprias tripas.
- Darini
segunda-feira, 4 de maio de 2009
Bill Maher
Há tempos que venho acompanhando os vídeos desse cara, comediante da HBO (acho), ferrenho defensor da racionalidade contra o que chama de "religião organizada" (fez o documentário "Religulous"). Anti-Bush assumido, é o cara do tipo "ame ou odeie", pois coleciona simpatizantes e críticos. Um programa histórico seu foi quando ele tirou a força, de seu programa, os chamados "911 truthers", um povo que acredita que um dos prédios do WTC foi implodido deliberadamente pelo governo dos EUA:
"Bill Maher & 911 Truthers"
Faz parte do PETA, portanto é boa gente 8) . Mas, como ninguém é perfeito, ele acha que os irmãos Wright inventaram o avião:
Clique aqui - vale a pena ver, pois ele dá uma zoada com o Brasil e com o futebol.
E, aqui, ele cita o Brasil no quadro que chamava "Exit Strategy". Eram dicas de fuga caso o McCain ganhasse a eleição, morresse e a Sarah Pallin assumisse a presidência.
É um tipo de formador de opinião que, definitivamente, precisávamos ter no Brasil. Mas, conhecendo nosso povinho e a demagogia que o cerca, creio não duraria no ar nem por uma semana.
- Darini
sábado, 2 de maio de 2009
Ensaio sobre a Cegueira - Livro de José Saramago
Em seu "Ensaio sobre a Cegueira", Saramago critica o rumo que as coisas tomaram nesta época em que vivemos. A "cegueira branca" que se alastra pela cidade, poupando apenas uma mulher, nos faz refletir sobre os problemas que, para a maioria de nós, passam despercebidos. Por quantas vezes, em nossa rotina "automatizada", não damos atenção, fazemos vistas grossas ou, simplesmente, ignoramos necessidades humanas que nos estão logo à frente? Num tempo em que tudo deve ser rápido, automático e produtivo, o ser-humano está deixando de ser humano. Estamos virando "robôs que comem e respiram". O outro? "Que eu tenho a ver com as necessidades do outro?" Essa é nossa cegueira branca.
Nessa cidade (ou mundo) que criou Saramago, todos são iguais. Não há nomes para os personagens e o modo como o autor os apresenta (através de alguma característica, profissão ou defeito) torna-os mais vivos em nossa memória. Podemos nos esquecer de vários nomes de personagens provenientes de clássicos lidos outrora, mas, com certeza, lembraremos da figura da "mulher do médico", "o velho da venda preta" e, até mesmo, do "cão das lágrimas" por muito tempo, até mesmo pelo fato de serem personagens do dia-a-dia, que podem ser encontrados em qualquer cidade real. A prostituta, o velho, o ladrão, o motorista de táxi, o menino abandonado... são eles que protagonizam o Ensaio. Não são heróis, mas pessoas marginalizadas sobre as quais o autor coloca os holofotes. Ele mostra que elas existem e que podem superar suas dificuldades, principalmente se houver uma mão amiga que os guie (mulher do médico).
A cegueira branca, de certa forma, atinge o leitor. Como pode uma jovem, às vistas da sociedade, apaixonar-se por um homem pobre, defeituoso e que não segue os padrões convencionais de beleza? Durante a leitura, não acreditamos que isso pudesse acontecer, mas o sentimento que nasce entre a rapariga de óculos e o velho da venda preta é maior do que qualquer "convenção" ou interesse superficial que possa surgir no coração humano. É algo profundo e que transcende qualquer estereótipo ou preconceito.
Pessoas do povo que se tornam mais iguais do que nunca, e têm de conviver em comunidade por tempo indeterminado aturando suas diferenças e defeitos. O governo? Este já está cego antes de tudo e de todos, pois fazem o que muitos governantes fazem: eliminam o mal, mas não sua causa. O modo desumano com que os "contaminados" são tratados realmente impressiona: tudo a eles é feito à distância. Um passo em falso, e a morte lhes era certa. O medo daqueles ditos diferentes causa uma celeuma coletiva: "teve contato com um cego? Está condenado!"
Os personagens precisam passar por uma revolução de vida para serem curados de sua cegueira. Provavelmente, é isso que José Saramago espera daqueles que lerem esta obra: quando vamos fazer nossa própria revolução de vida, e nos curar de nossa cegueira branca?
O "Ensaio sobre a Cegueira" é um ótimo livro, tanto na técnica utilizada pelo autor para escrevê-lo (parecendo um filme, tamanha a dinâmica do texto), assim como uma obra filosófica, para que pensemos no ser-humano como humano e liberto de sua cegueira coletiva.
- Darini